OCEANO NA COP30

“O Amanhã não está à venda”

Ailton Krenak

      O conhecimento sobre os problemas socioambientais tem sido divulgado há décadas. Publicações relevantes revelaram para o público fatos e análises preocupantes. A “Primavera Silenciosa” de Rachel Carson (1962) denunciou o perigo do uso indiscriminado de pesticidas químicos sintéticos, como o DDT. O relatório bombástico “Os Limites do Crescimento”, encomendado pelo Clube de Roma a pesquisadores do MIT (1972), apontou como “principal conclusão que a manutenção do crescimento econômico e populacional nos moldes então vigentes levaria a um colapso global em 100 anos”. As evidências da futura crise ambiental planetária foram se tornando mais numerosas e irrefutáveis.

     Em junho de 1972, a Conferência de Estocolmo reuniu representantes de 113 países para debater formalmente as questões ambientais. Foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

    Duas décadas depois, em 1992, no Rio de Janeiro, na Cúpula da Terra (ECO-92), foi criada a Conferência das Partes (COP) da ONU. Desde de 1994, todo ano, a COP reúne os Estados-membros (hoje – 193 membros): líderes mundiais, cientistas e representantes da sociedade civil para discutir políticas e ações sobre as mudanças climáticas, ameaças à biodiversidade e estabelecer metas atender a Agenda 2030. Ao longo dos anos foram estabelecidos acordos históricos como o Protocolo de Quioto (1997) e o Acordo de Paris (2015).

Mas fica a pergunta no ar, depois de décadas, com muitos dados científicos irrefutáveis, muitas discussões entre os Estados-membros, acordos assinados, prazos adiados, o que realmente avançamos para garantir um desenvolvimento sustentável, a proteção do meio ambiente e da população mundial em estado de vulnerabilidade?

Esse ano a COP30 será no Brasil, em Belém do Pará e as expectativas são imensas. Dentre os diversos desafios são destaque: 1- fortalecer os compromissos globais para combater as mudanças climáticas, com a revisão das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), buscando avançar na direção à meta de limitar o aquecimento global em 1,5OC; 2 – promover a justiça climática incluindo as desigualdades sociais, pautando soluções voltadas para os povos indígenas e comunidades tradicionais; 3 – incentivar a participação da sociedade civil, incluindo os povos indígenas, as comunidades quilombolas e a juventude, que são os mais afetados pela crise climática; 4 – o engajamento do setor empresarial para as práticas alinhadas a, o conceito ASG (Ambiental, Social e Governança) – conjunto de critérios para avaliar o desempenho de uma empresa em relação à sustentabilidade e responsabilidade.

Apesar dos esforços na COP26, em Glasgow em 2022, quando foi estabelecido um pacto com regras para determinar as emissões de gases estufa (GE), mercado de carbono e metas mais ambiciosas para a redução de emissões até 2050, na prática pouco estamos longe das metas propostas.

Segundo os dados publicados pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), estima-se que no atual ritmo de emissão de GE chegaremos aos 1,50C até 2040. Isso significará maior frequência de eventos extremos como incêndios extensos, inundações mortais, derretimento das áreas de gelo marinho, perda irrecuperável de habitats terrestres e marinhos.

E qual é o papel do Oceano no cenário planetário?

O oceano ou os oceanos formam o bioma que ocupa 71% da superfície do nosso planeta azul. Muitos são seus serviços ecossistêmicos vitais para a humanidade e precisamos entender seu papel para manutenção do equilíbrio climático. Para garantir a homeostase climática é preciso que o oceano esteja saudável.

Então, na COP30, o oceano vai ocupar um lugar de destaque, seja pelo seu papel como elemento fundamental para mitigar as mudanças climáticas extremas, seja como fonte de recursos para desenvolver a Economia Azul (EA), ele está no centro da mesa de negociações e acordos.

Nesse ponto, cabem várias perguntas relevantes. Mas vamos destacar duas delas:

Como estabelecer uma governança oceânica resiliente e coerente que reduza os impactos negativos que hoje estão adoecendo os ambientes costeiros e marinhos?

Sabemos que na mesa do desenvolvimento econômico, no pacote oceânico, existem projetos de mega empreendimentos como mineração em profundidade, pesca industrial sem controle, aquicultura de grande porte, produção de petróleo offshore, dentre outros. No Brasil, há possibilidade de contratos para produção de óleo a partir da extração em áreas sensíveis e importantes como na proximidade da foz do Amazonas.

Nesse cenário global, a preocupação, proporcional aos riscos socioambientais, é entender que acordos poderão ser estabelecidos conciliando as duas vertentes (econômica e ecológica) de forma sustentável?

Nas palavras do Embaixador Carlos Márcio Cozendey, Secretário de Assuntos Multilaterais Políticos; “Estamos colocando muita energia e esperança no Planejamento Espacial Marinho, para sermos capazes de integrar os oceanos no desenvolvimento nacional de forma sustentável”. Os especialistas internacionais advogam que é preciso se concentrar no que se deve alcançar, bem como no que se deve evitar. Advogando, por exemplo, as estratégias que consideram todos os fatores dinâmicos e riscos de acidentes que afetem além das chamadas zonas de sacrifício. Ou seja, as áreas de proteção permanente do oceano, que deverão atingir 30% da superfície oceânica, não podem ser afetadas pelas atividades humanas que utilizam os recursos para a produção de energia, extração de minerais, pesca industrial e para aquicultura não sustentável.

É urgente discutir como ampliar a visibilidade do oceano na agenda climática e fortalecer as  recomendações elaboradas pelas organizações signatárias do “Compromisso para o Futuro do Oceano” que foram elaboradas a partir do painel Ideias Azuis: O Oceano na COP 30, realizado na Rio Ocean Week 2025.

Dentre as recomendações propostas para o Eixo II: Proteção de Florestas, Oceano e Biodiversidade, vale destacar:

Exigir transparência total e acesso público aos dados de monitoramento da qualidade da água, poluição e saúde dos ecossistemas, identificando e combatendo a contaminação do hotspots.

Implementar programas robustos de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) costeiros que remunerem comunidades locais pela conservação ativa de manguezais e outros sumidouros de carbono azul.

Integrar urgentemente o ODS 14 (Vida na Água) como um pilar central do Marco Global de Adaptação (GGA), reconhecendo o oceano como fundamental para a resiliência climática.

Estamos diante de um desafio hercúleo para estabelecer o equilíbrio entre as metas da Agenda 2030 e um real desenvolvimento sustentável para todos. É urgente incentivar mudanças de comportamento do consumidor, dos atuais modelos de produção para que sejam redesenhados sob os conceitos da uma economia circular.

No que diz respeito ao futuro, não se trata de prever, mas de torná-lo possível.”

                     Antoine de Saint Exupéry , Citadelle, 1948

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