BYCATCH E A PESCA PERVERSA

As redes e linhas de pesca perdidas ou deixadas nos ambientes aquáticos, em especial os marinhos, são fatais para milhares de indivíduos.

O termo bycatch é usado para representar a pesca acidental ou incidental que ocorre quando o animal, que não era o foco daquela operação de pesca, é capturado junto com a espécie-alvo. Isso acontece quando as redes de espera ou de barcos pesqueiros industriais capturam os organismos não desejados, e mesmo que esses animais ainda vivos sejam devolvidos ao mar, estão tão feridos que não têm condições de sobreviver.

Dados levantados pela Proteção Animal Mundial apontam que entorno de 640 mil toneladas de petrechos de pesca são deixados à deriva nos oceanos todos os anos. Como as redes de pesca, em geral, são feitas de nylon, levam dezenas de anos para se decompor e permanecem capturando animais por tempo indefinido.

Estima-se que pelo menos 40%, cerca de 38 milhões de toneladas dos pescados anuais do mundo tenham sido mortos por bycatch. No Brasil, entorno de 69.000 animais marinho morrem todo dia como resultado da pesca fantasmas (nome dado porque as redes não são percebidas pelos animais).

O uso de redes de arrasto é considerado uma das técnicas mais destrutivas porque captura os animais de forma ampla e indiscriminada. São redes enormes, as vezes maiores que campos de futebol. Passam pelo fundo do mar e devastam ecossistemas e habitats que levaram centenas ou milhares de anos para se formar, tais como recifes de corais – lares de diversas espécies que dependem desses ambientes para sobreviver.

As consequências dessas capturas são alarmantes. Populações relevantes desde corais até baleias, principalmente as espécies que vivem em áreas mais sensíveis, são afetadas a tal ponto que perdem a capacidade de recompor as populações e entram em declínio podendo afetar toda a cadeia alimentar incluindo as espécies de interesse comercial.

Exemplos marcantes: a vaquita, um cetáceo, registrado com alto risco de extinção, tem como principal causa-morte o enforcamento e afogamento por redes de pesca. Fato tão frequente que aumenta o risco de extinção. Também chocante são os dados que sugerem o bycatch como principal fator de causa-morte do baiji – o golfinho-do-rio-Yangtze, espécie já considerada extinta. Esses dois cetáceos endêmicos de suas localidades são imagens marcantes para alertar a importância de combater essa cruel situação.

Além dos animais aquáticos, um estudo de 2003 publicado pelo Smithsonian Institute revelou que cerca de 300.000 aves são mortas a cada ano por captura acidental, dessas 100.000 são albatrozes.

De acordo com a WWF existem várias soluções comprovadas que podem diminuir o problema do bycatch:  modificar as artes de pesca para que menos espécies não-alvo sejam capturadas ou possam escapar. Algumas dessas modificações são simples e baratas. Muitas vezes soluções eficazes vêm dos próprios pescadores.

No concurso “Prêmio Europeu Natura 2000”, entre os 21 finalistas, estava um projeto da equipe técnica da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves. O trabalho desenvolvido com os pescadores de Peniche obteve resultados promissores. Utilizando um “espantalho” com imagem de uma ave predadora hasteada nos barcos de pesca, os resultados foram excelentes. Conseguiram afastar as aves marinhas das linhas de pesca. Simples e genial.

Outra pesquisa preliminar promissora foi publicada em 2000 pelo Programa Golfo de California, Miramar. Sistemas de redes para pesca do camarão foram projetados com os chamados dispositivos para reduzir o bycatch (BDR). Os resultados obtidos apontaram uma estimativa que o uso desse dispositivo geraria a redução anual da captura acidental de 73 mil toneladas de animais marinhos.

Para implementar soluções eficazes e urgentes as Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) acatou um pedido da World Animal Protection (Proteção Animal Mundial). Até 2025, todos os países membros da FAO deverão garantir que os petrechos de pesca sairão das lojas identificados com um mecanismo de GPS. O sistema permitirá a fiscalização, localização e o resgate das redes perdidas ou abandonadas, além de facilitar a autuação dos eventuais responsáveis. Espera-se que assim seja possível diminuir significativamente as capturas por redes fantasmas.

Para além das boas intensões, fica a pergunta de como disseminar, nas colônias de pescas artesanais brasileiras, que produzem suas próprias redes, sistemas cujos custos não podem ser por assumidos por esses profissionais.

Para diminuir o bycatch e a pesca fantasma é preciso estimular projetos que promovam o uso das redes localizáveis e incentivem o resgate das redes em desuso para serem transformadas em artefatos com valor agregado. Desafios que devem envolver soluções exequíveis e inclusivas.

No Brasil existem grupos que geram renda para as comunidades de pescadores artesanais transformando redes sem uso em bolsas e outros utensílios atraentes para o mercado. Mas, o mercado precisa existir e, para isso, deve ser incentivado.

As soluções para diminuir o bycatch e a pesca fantasma são promissoras, mas elas dependem dos tomadores de decisão das indústrias pesqueiras, dos pescadores artesanais e de leis que estimulem as boas práticas e promovam os incentivos fiscais adequados. 

Referências:

Autora: Luna Vaz

Revisão: Marlise Araújo

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