ECONOMIA CIRCULAR NA DÉCADA DA CIÊNCIA OCEÂNICA.

@ec.europa.eu

O alerta do Painel Intergovernamental da Mudança Climática (sigla em inglês – IPCC) ecoou pelo mundo e expôs o risco que corremos com o atual modelo econômico. Nosso modus operandi de produção de bens de consumo nos empurra para um aumento de temperatura global acima dos 20C. Isso provocará o aumento do nível do mar em certas áreas do oceano onde países insulares sofrerão de forma irreversível. Paraísos desaparecerão!

Estamos enlouquecendo o clima, poluindo o oceano e exterminando a biodiversidade.

 O aumento global de temperatura já resultou em eventos climáticos extremos com incalculáveis prejuízos de trilhões de dólares e milhares de vidas.

Para inverter essa lógica de exploração dos recursos naturais de forma insustentável e de poluir sem responsabilidade, é preciso repensar as cadeias de produção: da obtenção da matéria-prima ao desenho dos materiais, do destino das embalagens às fontes de microplástico, da mídia que seduz e oferece produtos estimulando o culto ao supérfluo ao direito à etiquetas claras, e muito mais.

A Década da Ciência Oceânica poderá contribuir para redesenhar a lógica dos valores que determinam o consumo humano dos que tem o poder aquisitivo e da justiça socioambiental para os que vivem vulneráveis, sem dignidade, com medo do que pode acontecer no dia seguinte.

A busca por soluções baseadas na natureza deve ser incentivada e implementada pelos tomadores de decisão, que tem a obrigação de incentivar os sistemas de produção projetados com metodologias que protejam os ecossistemas naturais.

O atual modelo econômico linear precisa mudar!

É necessário endossar e ampliar os acordos para uma nova era da economia mundial que respeite os limites dos ecossistemas naturais e inclua as relações sociais interculturais de forma mais solidária. Aprofundar o conhecimento para aprimorar as tecnologias limpas e sustentáveis e investir em projetos com boas práticas socioambientais.

Uma economia mais circular pode trazer benefícios como redução da pressão sobre o meio ambiente, melhoria da segurança do fornecimento de matérias-primas, aumento da competitividade, estímulo à inovação, aumento do crescimento econômico e criação de empregos.

Esse sistema que valoriza o retorno dos recursos utilizados ao ciclo produtivo contribui para atingir diversas metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: ODS 1 (erradicação da pobreza); ODS 11 (cidades e comunidades sustentáveis); ODS 12 (produção e consumo sustentáveis). Essas evidências respaldam a mudança do modelo de produção linear para o modelo circular.

Nesse sentido o modelo da Economia Circular (EC) tem o potencial de atender o conceito da real sustentabilidade. Porém, para ser implantado de forma ampla e robusta, será vital que os novos processos produtivos sejam amparados por políticas que respaldem o redesenho de processos, materiais e embalagens. E, fundamental, criar sistemas de governança que engajem todos os atores públicos e privados, e integre toda a vida do produto de ponta a ponta. 

O lema estruturante é “nada se perde, tudo se transforma”: isso é economia circular

 “Economia Circular é um conceito abrangente, multidisciplinar e agregador. Os esforços da sociedade para acelerar a transição envolverão, necessariamente, adaptações do conceito para a realidade de cada região, país ou município. Por isso, a pesquisa foi fundamental para estabelecer os primeiros alicerces de uma Economia Circular “tropicalizada”, uma transição à brasileira, que está sendo construída coletivamente para um país com talento natural para a circularidade.” – Luiz Ricardo Berezowski, Gerente Sênior da Unidade de Negócio Nat.Genius, Embraco1

Precisamos partir das seguintes premissas que contribuem para atingira as metas da Agenda 2030: crescimento desconectado da exploração dos recursos naturais; ciclos fechados de produção desenhados para não gerar resíduos; novas formas de produção e consumo; novos materiais e novas fontes de energia, e foco em criar e manter o valor ao longo da cadeia produtiva. Esse último quesito é muito dependente de incentivos legais que deem suporte para os investimentos em logística e tecnologias limpas de reciclagem.

De acordo com a Ellen McArthur Foundation as escolas de EC mais relevantes são:  

Design regenerativo – sistemas e processos nos quais as fontes de energia e matérias-primas seriam renovadas e reutilizadas, sem a necessidade de novas fontes a cada novo ciclo do sistema.

Economia de performance – representado pelo Product Life Institute, centro de pesquisa de sustentabilidade, cujas metas principais são: a extensão da vida do produto, bens com longa durabilidade, atividades recondicionantes e prevenção de desperdício. Ou seja, essa escola se contrapõe à tendência atual de muitas empresas que desenham sua produção utilizando o conceito da obsolescência programada que alimenta um comércio de bens de curta duração.

Cradle-to-Cradle (do berço ao berço) – considerada uma das mais influentes na formação da Economia Circular, esse modelo defende que todos os insumos, matérias primas e componentes utilizados voltem ao seu “berço” após a utilização dos bens, fechando um ciclo. Elimina a noção de lixo e afirma que “waste equals food” (lixo equivale a comida).

Diversos setores empresariais vêm desenvolvendo processos com sistemas circulares de produção. Essa é a nova aposta das empresas para promover a relação entre marcas, produtos e consumidores conscientes. Com a prioridade de reutilizar os recursos para gerar novos produtos, as empresas oferecem um novo valor agregado muito significativo, que incentiva o movimento circular e reforça a importância de reduzir o consumo e o desperdício.

No Brasil, a economia circular carece avançar em diversas frentes. É preciso aumentar os investimentos para estimular a pesquisa nas áreas afim, as inovações tecnológicas de produção, novos designs de materiais e logística. Em diversos casos o estado da arte técnica existente é suficiente para solucionar grandes problemas, mas falta de governança, projetos consistentes e sustentáveis, têm sido um gargalo para mudarmos essas situações danosas.

De acordo com os resultados do estudo liderado pela ONU, a maior parte do desperdício de alimentos – o equivalente a 61% – vem das famílias. Ou seja, das casas de cada um de nós. De acordo com os resultados, o Brasil, descarta 60 kg de alimentos por pessoa por ano. No modelo circular, além do hábito de reduzir o desperdício existe o retorno ao ciclo: todo resíduo orgânico é passível de ser reciclado e fechar o ciclo como adubo das novas plantações.

O ciclo dos resíduos recicláveis, é também um alvo ideal para a economia circular. Eles podem voltar para a cadeia produtiva. Diversos materiais já contam com tecnologia de transformação viável, mas no presente momento ainda carecem de gestão, logística reversa, responsabilidade e sensibilidade coletiva.

De acordo com a ABRELPE (2020) os recicláveis secos são estimados em 39,2%. O desafio para o município retornar esse material ao processo produtivo está vinculado diretamente à qualidade da segregação na fonte geradora.  A pouca informação e mobilização por parte do gerador/consumidor faz com que grande parte do material reciclável seco chegue aos galpões de triagem muito sujos e misturados, por exemplo, com resíduos orgânicos. Reciclável contaminado não possui valor de mercado e acaba disposto em aterro sanitários, onde existe, ou em lixões. Isso onera o processo de reciclagem a ponto de inviabilizar economicamente o ciclo de retorno como recurso para novo ciclo de produção.

O Brasil, é um país com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, nada mais natural do que explorar novos modelos de negócios, que considerem os diversos acordos internacionais e, ao mesmo tempo, promovam o desenvolvimento sustentável, equilibrado com inclusão social e conservação ambiental.

O tratamento dos resíduos propicia a geração de trabalho, de emprego e de renda. A indústria da Economia Circular precisa ampliar os sistemas de reciclagem que incluam a participação da população nas soluções dos problemas relacionados aos resíduos gerados por cada um, tanto no domicílio como nos espaços de trabalho e lazer.

Em 2019, a Comissão Europeia adotou o Novo Acordo Verde e 10 regulamentos para implementar o ecodesign. Em 2020 foi um elaborado o Plano que aponta medidas para ajudar a estimular a transição da Europa para uma economia circular e promover o crescimento económico sustentável e gerar novos empregos. Do outro lado do globo, Shu Zhu, Diretor Regional e Representante da China, ICLEI Leste Asiático também afirmou o apoio para construir cidades circulares com base em sistemas regenerativos, que compartilhem suas melhores práticas entre si e com parceiros visando o desenvolvimento circular para um futuro sustentável. 

Nos próximos dez anos temos o desafio de encontrar respostas para implementar ações e fortalecer atitudes que restaurem o equilíbrio e a resiliência dos oceanos e dos ecossistemas terrestres, que mitiguem os impactos causados pelo atual modelo de produção e consumo. Este é o único caminho para fazer frente às mudanças climáticas, aos riscos de novas pandemias e chegarmos ao ponto de não retorno para as condições que sustentam a vida e conseguir entregar um mundo seguro e saudável para as gerações futuras.

Vamos nessa?

Texto: Marlise A V Araújo, Cristina Luttner & Andrea Portugal Fellow

Revisão: Ricardo Portugal

Referências:

  1. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/Uma-Economia-Circular-no-Brasil_Uma-Exploracao-Inicial.pdf
  2. https://ec.europa.eu/environment/topics/circular-economy/first-circular-economy-action-plan_en
  3. https://www.ideiacircular.com/estudos-de-caso-economia-circular/
  4. More Jobs, Less Pollution: Growing the Recycling Economy in the U.S., por: Tellus Institute with Sound Resource Management

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